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Sabores e ancestralidade como resistência. Ensinamentos, luta e legado da chef Angélica Moreira



 Uma de nossas maiores inspirações de luta e resistência contra o racismo estrutural, infelizmente, não está mais entre nós fisicamente; voltou ao Orun. Mais do que a tristeza em nossos corações, fica o agradecimento pelo caminho construído, a generosidade na partilha de seus conhecimentos ancestrais, o legado deixado e as sementes plantadas. Nosso muito obrigado à pedagoga, chef de cozinha e escritora, Angélica Moreira, que faleceu nesta segunda-feira (06).


Angélica era Ajoiê de Oxum do Ilê Axé Opô Afonjá. Idealizadora e coordenadora do projeto “Ajeum da Diáspora, uma etnogastronomia afrodiásporica”, utilizava as receitas culinárias da África, adaptadas com seu toque de chef brasileira e conhecimento ancestral, como ferramenta de resistência, divulgação e fortalecimento da cultura negra. Assim, em apreço ao seu trabalho, personalidades brasileiras e mundiais, militantes contra o machismo e o racismo estrutural fizeram questão de conhecer o projeto e a culinária da chef Angélica. Entre essas personalidades estão a filósofa e ativista Angela Davis e a linguista e escritora Conceição Evaristo. Seu projeto também foi visitado pelos chefs internacionais Anthony Bourdain e Roblé Ali, e a arte resistente da chef Angélica rompeu fronteiras, com a sua    culinária sendo reconhecida em diversos países, a exemplo do México e do Japão. 

Roda de saberes

Nas atividades pertinentes ao Novembro Negro da ADUNEB, do ano passado, a seção sindical teve o privilégio de ter a participação da chef Angélica Moreira em uma roda de saberes. Ela falou sobre as suas experiências e os legados ancestrais africanos no enfrentamento antirracista. Para a chef, que também era pedagoga, formada pela UNEB em 2013, a união de todas as forças progressistas da sociedade, dos grupos que defendem os saberes ancestrais, aliados aos que defendem a educação, poderá romper barreiras e levar o país a um outro momento da história. Angélica defendeu também a maior valorização das baianas de acarajé e de outras mulheres negras que fazem da culinária africana cultura e resistência.

Mulher de luta

Nascida na pequena cidade de Itaquara, região Sudoeste da Bahia, devido a um período de extrema seca, aos sete anos foi obrigada a vir morar com a família em Salvador. Na Capital Baiana, viviam na Fazenda Grande. Angélica conseguiu superar obstáculos e estudar. Depois, teve que encarar a realidade do mercado de trabalho para ajudar a pagar as contas do lar.

Desde cedo, sentiu as dores do racismo e a necessidade de união para lutar contra a opressão. Entrou para o Movimento Negro de Salvador enquanto o mesmo ainda escrevia suas primeiras páginas. Aos 18 anos, teria sido repreendida pela mãe por ter raspado o cabelo alisado para iniciar o penteado Black Power, um símbolo de contestação e do empoderamento negro. Após inúmeras batalhas, sem perder do horizonte o sonho e a importância da educação superior, entrou, aos 49 anos, no curso de Pedagogia da UNEB. Suas experiências e memórias estão registradas no livro, lançado no ano passado, "Memórias da Cozinha Ancestral", um projeto financiado por meio da Lei Aldir Blanc de apoio à cultura.

A guerreira Angélica deixa três filhas, Daza, Inaê e Safira, que, assim como as inúmeras pessoas a quem pôde ensinar com sua ancestralidade, são sementes que continuam a florescer e perpetuar os passos que vêm de longe. 

Chef Angélica Moreira, presente!
Pedagoga Angélica Moreira, presente!
Militante antirracista Angélica Moreira, presente!
Escritora Angélica Moreira, presente!
Mãe Angélica Moreira, presente!
Mulher negra Angélica Moreira, presente!

Coordenação ADUNEB

Com informações do site Geledés