Apoiar gravidez de criança resultante de estupro é ato desumano e de incentivo ao crime
O que faz uma criança de dez anos? Deveria brincar, sonhar, sorrir, passear pelo universo da fantasia e acreditar que o mundo tem gosto de chocolate. Mas, para ela não! Dela, o direito de ser criança foi lhe brutalmente arrancado aos seis anos de idade, no momento em que passou a ser estuprada por um tio. Agora, aos dez anos, grávida, com a autorização da Justiça para interromper a gravidez, grupos fundamentalistas religiosos ainda deturpam o episódio, criticam a criança, chamam-na de "assassina", insinuam a sua "não-inocência" e contribuem de modo indelével com as suas dores do viver.
O caso, amplamente divulgado no domingo (16) na imprensa, ocorreu inicialmente no Hospital Roberto Silvares, em São Mateus (ES). A menina grávida de cinco meses, devido ao risco de vida na gestação e os problemas psicológicos acarretados, recebeu a autorização da Justiça para ter a gravidez interrompida. Porém, a decisão judicial mesmo amparada pela lei que permite o aborto para vítimas de estupro, feto anencéfalo ou risco de morte à mãe, foi desrespeitada pelo Hospital Universitário Cassiano Antônio Moraes (HUcam). A menina teve que ser levada a Recife para realizar o procedimento, em um Centro Integrado de Saúde.
Entretanto, se já não bastasse todo o sofrimento, um grupo de religiosos fundamentalistas iniciou manifestação em frente ao centro médico. Em coro chamaram os médicos de assassinos, colocaram em dúvida a índole da criança e ameaçaram invadir o hospital. O fato só não ocorreu porque a rápida mobilização de militantes feministas, em defesa da vida da menina, ocupou a frente do centro médico e, finalmente, a criança e a justiça foram atendidas.
A ADUNEB vem a público se solidarizar com a criança e sua família obrigadas a enfrentar tal tragédia. Ao mesmo tempo, a coordenação executiva do sindicato, formada por sete mulheres, repudia as frações obscurantistas da sociedade que tentaram impedir a interrupção da gravidez, consequentemente, colocaram-se a favor do ato hediondo de estupro à criança. Tal fato evidencia o machismo estrutural brasileiro, que ainda tenta impor o domínio sobre os corpos e a vida das mulheres. A ADUNEB ressalta ainda a importância da rápida ação do Movimento Feminista que conseguiu contrapor a manifestação do grupo extremistas de direita.
O sindicato repudia ainda a postura da liderança bolsonarista, Sara Geromini (vulgo Winter) investigada no inquérito das fake news e que esteve presa por incentivar o ataque ao Superior Tribunal Federal. Ela foi a responsável por divulgar a identidade da vítima nas redes sociais.
Após todo o lamentável episódio, duas perguntas precisam ser respondidas. A primeira é que tipo de ser humano apoia a gravidez de uma criança, fruto de estupro, coloca em dúvida a inocência da menina e ainda expõe sua identidade ao mundo? Apoiar gravidez resultante de estupro é, sem dúvida, compactuar com o crime. O segundo questionamento a ser respondido é quem teria passado à Sara Winter o nome da criança? Como os grupos fundamentalistas ficaram sabendo para onde a menina foi levada? Quem mobilizou tais pessoas?
Publicações na mídia, no início desta semana sugeriram que o nome confidencial da vítima era de conhecimento do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, comandado por Damares Alves, que já declarou na imprensa considerar Sara Winter como filha. Será mera coincidência?
De tudo, a única certeza é que essa não será a última ação dos grupos fundamentalistas religiosos que apoiam o governo de Jair Bolsonaro. Assim como fizeram as militantes do Movimento Feminista do Recife, a resposta da esquerda aos crimes e ao discurso de ódio da direita precisam ser rápidas e organizadas. Somente a união de todas e todos, dos mais variados setores da esquerda poderá barrar o avanço das/os obscurantistas.