Nota de Repúdio ao Governo Federal que, ilegalmente, dá posse de terras indígenas ao agronegócio
O obscurantismo e a nefasta necropolítica do Governo Federal, de Jair Bolsonaro, de privilégio ao capital, ao agronegócio e perseguição às minorias, acaba de levar a questão agrária e a problemática indígena do país ao ano de 1500. Publicada no último dia 22 de abril, a Instrução Normativa nº 9/2020, guardadas as devidas proporções, pode ser considerada a atualização da carta de Pero Vaz de Caminha quando invadiram o Brasil.
Há mais de cinco séculos, a carta do colonizador português declarava as terras brasileiras como parte das posses do reino de Portugal. Agora, a Instrução Normativa nº 9, divulgada pela Funai, autoriza a emissão de títulos de propriedade privada das terras indígenas, demarcadas ou em processo de homologação, a posseiros, grileiros e produtores a serviço do agronegócio. Na prática, a Fundação Nacional do Índio acaba de se transformar em um cartório de certificação de imóveis.
Juristas de todo o país analisaram a norma como inconstitucional, sem qualquer respaldo jurídico e, flagrantemente, contraditória com o Marco Legal dos Direitos Indígenas do Brasil. Assim, o Ministério Público Federal move uma ação com o intuito de anular a normativa.
Caso o Governo, mais uma vez, consiga burlar a Constituição Federal e o Estado de Direito, o impacto da Instrução Normativa (N.I.) aos povos originários será devastador. Atualmente, mais da metade das terras indígenas no país ainda estão por ser demarcadas. Mesmo nos territórios já demarcados ou em processo de homologação, falta a assinatura do Presidente da República, de acordo com os termos do Decreto 1775, de 1996, que regula e normatiza a questão da demarcação da terra. Segundo dados da própria Funai, há hoje 237 processos abertos e pendentes para o reconhecimento das terras indígenas. Existe processo aberto e não concluído datado de 1982.
As consequências negativas da I.N. nº 9/2020 recairão sobre as comunidades indígenas de todo o país, porém, segundo pesquisadores e militantes da causa indígena, os povos mais prejudicados serão os localizados no Nordeste, Leste e Centro-Oeste, regiões em que a maioria do território ainda está por ser demarcada. Na Bahia, por exemplo, mais de 70% das terras indígenas ainda necessitam demarcação.
Nota-se que a necropolítica do Governo Federal não é aplicada exclusivamente às minorias das periferias dos municípios brasileiros, mas também no campo. A nova norma em questão proporcionará o acirramento dos conflitos pela terra elevados a um exponencial altíssimo. Inúmeras lideranças indígenas passam a correr ainda mais risco de morte, assim como suas famílias.
A ação do Governo Federal de extrema direita que já era grave, ganha contornos ainda piores neste período em que o país e o mundo sofrem com a pandemia causada pela Covid-19. No momento em que o Estado brasileiro deveria marcar presença, reconhecer a importância, a vulnerabilidade dos povos indígenas e acolhê-los de maneira digna e com atendimento à saúde, a atitude de Bolsonaro é a intensificação da perseguição.
Ainda segundo pesquisadores e militantes da causa indígena, o governo Bolsonaro utiliza principalmente três estratégias contra as comunidades indígenas: 1) A tentativa de execução de portarias inconstitucionais, a exemplo da I.N. 09/2020, que até ser derrubada leva tempo e imprime ataques aos povos originários; 2) Negligência no cuidado, falta de zelo e irresponsabilidade na fiscalização dos direitos indígenas; 3) Corte do orçamento para a questão indígena. Atualmente a Funai trabalha com apenas 20% dos recursos orçamentários que tinha há 4 anos.
Sobre a questão orçamentária, em 14 de abril, o jornal O Estado de S. Paulo denunciou que há 15 dias a Funai já havia recebido R$ 10,8 milhões para o combate emergencial ao coronavírus nas comunidades indígenas. Mas, até aquele momento, o recurso estava intacto. Assim, torna-se ainda mais evidente a política de Estado de perseguição e genocídio da população indígena.
Com uma história de mais de 500 anos de bravura e luta, diante da atual conjuntura amplamente desfavorável, os povos originários seguem adiante, unidos e na resistência. A ADUNEB reitera a necessidade da união de todos os setores progressistas do país em defesa dos direitos indígenas. É premente que movimentos sociais, populares, sindicais e demais organizações políticas fiquem alertas e reajam a qualquer tentativa de ataque aos povos originários, os verdadeiros donos da terra e protetores das florestas.
Coordenação ADUNEB