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Presidente da Chapa 1, Andes Autônoma e Democrática, aborda as resoluções do congresso da categoria

A presidente da Chapa 1, Andes Autônoma e Democrática, Marina Barbosa, dá entrevista ao site da Conlutas e aborda, entre outras questões, as resoluções do congresso da categoria, as políticas do governo Lula para a educação e a relação do ANDES-SN com a Conlutas.

Conlutas - Sob a “Contra-reforma Universitária, ataques à Carreira e ao trabalho docente: desafios do ANDES-SN na luta em defesa da Universidade Pública”, o 29º Congresso do ANDES-SN, realizado de 26 de janeiro a 1 de fevereiro em Belém (PA) aprovou importantes deliberações. Quais você acredita que são as mais importantes?

Marina Barbosa - O Congresso anual do ANDES-SN é um momento único para o estabelecimento dos Eixos Centrais de atuação, das Políticas Sociais e de sua operacionalização por meio do Plano de Lutas para o sindicato. Há, portanto, uma gama variada de decisões a partir de propostas tanto da diretoria quanto de seções sindicais e sindicalizados. De certa forma, essas deliberações são todas importantes porque expressam respostas a questões e demandas determinadas pela conjuntura, além daquelas que dizem respeito aos enfrentamentos estruturais permanentes, que se baseiam nos princípios e nas raízes do nosso sindicato. Saliento como significativas algumas deliberações: em relação à carreira docente, a manutenção da perspectiva de carreira única para todos os setores do ANDES-SN (Estaduais, Federais, Municipais e Particulares), e a reafirmação dos princípios básicos do ingresso por concurso público, isonomia, paridade entre ativos e aposentados e valorização do regime de Dedicação Exclusiva; a intensificação da luta pela imediata desocupação das IES pelas Fundações Privadas, ditas de apoio; a luta pela abertura dos arquivos relacionados à ditadura; a luta pelo controle da mídia objetivando o fim dos monopólios nessa área; a adoção da política de cotas, mantendo a perspectiva das políticas universalistas; a luta contra a precarização do trabalho docente, a mercantilização do trabalho docente, a utilização de critérios produtivistas em processos avaliativos; participação ativa no processo de unificação e construção de uma nova central, classista, sindical e popular, aprofundando o debate na base; há ainda as deliberações tomadas em relação às especificidades de cada setor. Esses são alguns exemplos. Como se pode ver são todos temas importantes que serão trabalhados e desenvolvidos durante o ano, centrados na integração do sindicato com o movimento docente.

 

Conlutas - Esse foi um congresso eleitoral, do qual saíram inscritas duas chapas para concorrer às eleições em maio próximo. A Chapa 1, Andes Autônoma e Democrática, e a Chapa 2, Andes Para os Professores. Quais são as diferenças fundamentais entre as chapas?

 

Marina - O surgimento de outra chapa para concorrer na eleição para a diretoria do ANDES-SN, biênio 2010-2012, é de extrema importância. Isto significa que há o reconhecimento do sindicato como o representante legítimo de todos os professores do ensino superior. Diferente daqueles que querem a divisão do sindicato, uma chapa que se diz de oposição significa o reconhecimento do nosso espaço organizativo como democrático, onde se realizam os embates de idéias, prevalecendo o que determinar a maioria e de acordo com as instâncias do nosso sindicato. Quanto ao estabelecimento de diferenças, ficarão claras no desenvolvimento da campanha eleitoral. Desde já estamos firmes na perspectiva de fazer a luta do sindicato, dialogando permanentemente com os professores, base central do nosso movimento, mas entendendo que esse movimento não se faz desarticulado do conjunto dos trabalhadores. O ANDES-SN é criação dos professores, vinculado na luta contra a ditadura, pelas liberdades de organização sindical, fundado sob a bandeira de uma universidade pública e gratuita e na luta por condições de trabalho. Isto tudo num mundo real, num Brasil palpável onde milhões de pessoas sofrem a cada dia as injustiças da sociedade e os desmandos dos donos do poder. Portanto, não há como construir uma realidade distante, inatingível. E isto se faz operando as relações de classe e construindo a superação das estruturas opressoras. Assim é a chapa Andes Autônoma e Democrática. É dos professores e com responsabilidade social.

 

Conlutas - Como deve acontecer na prática a política de valorização do trabalho docente nas universidades, contra a precarização e a luta em defesa de uma universidade pública, uma das resoluções do congresso?

 

Marina - Essa é uma luta permanente, um dos fundamentos quando ainda éramos ANDES, Associação de Docentes das Instituições de Ensino Superior. O professor precisa de uma carreira. Vimos construindo essa carreira desde então. Aspiramos uma Carreira Única que inclua docentes de todos os níveis de ensino. Não aceitamos que o professor das IES que trabalhe no ensino fundamental ganhe, com a mesma qualificação, diferente de um professor do ensino superior. Não aceitamos que somente este faça pesquisa; aquele outro também é parte da universidade. Não é isto que o governo vem tentando programar. Ao contrário, tem trabalhado carreiras diferenciadas para as diversas modalidades de ensino, visão fragmentada das instituições de ensino superior, e pior, visão fragmentada do sistema educacional que tem sido imposto ao país. Temos também combatido veemente o uso exagerado do professor substituto. Este tipo de professor surgiu a partir da criação do PUCRCE, em 1987, e vem sendo escoadouro da política de esfacelamento do quadro de professores das universidades brasileiras. Aquilo que era para ser eventual tornou-se costumeiro. Há instituições com números absurdos de professores substitutivos. Precários, ganhando menos que os professores do quadro, docentes, não têm progressão, não são ocupam cargos administrativos, não votam e não são votados: não integram, portanto, o processo contínuo da vida da instituição. São efêmeros. Além disso, temos exigido que o professor seja contratado prioritariamente em DE, enquanto o governo vem sugerindo uma DE alavancada por projetos estranhos a universidade, quiçá articulada com interesses de fora da universidade. As menções feitas até agora se referem às instituições públicas. Nas instituições privadas o quadro é lastimável. A maioria dos docentes é contratada por hora de trabalho, não tem carreira, ficando inteiramente ao sabor dos desmandos do patronato. Muito menos há o desenvolvimento da pesquisa. Temos denunciado sistematicamente essa situação e procurando organizar os professores para a resistência e enfrentamento dessas questões. O grave é que as tentativas de organização para a cobrança dos direitos é respondida de forma violenta pelo patronato.

 

Conlutas - Como você vê as mudanças estatutárias aprovadas com o intuito de melhor configurar os procedimentos do Sindicato Nacional e garantir o seu fortalecimento, haja vista as iniciativas de ruptura provocadas por segmentos governistas e minoritários que buscam descaracterizar o Sindicato Nacional?

 

Marina - Nos Congressos do ANDES-SN, realizados a cada ano, são feitas discussões aprofundadas sobre a estrutura organizativa do sindicato. O Estatuto tem sido um importante elemento na luta política. Não que substitua o embate do dia a dia. O que ocorre é que cada vez mais a via jurídica vem sendo utilizada no ataque ao sindicato. Daí porque são necessários os aperfeiçoamentos constantes para que, na esfera jurídica, o sindicato esteja resguardado. Cito como exemplo a questão da homologação das seções sindicais. No estatuto não havia o cancelamento da homologação, agora foi introduzido. O que acontecia é que algumas seções sindicais se separavam do sindicato de forma unilateral não levando em consideração que o sindicalizado é em primeiro lugar vinculado ao sindicato nacional. Simplesmente deixavam de repassar as contribuições dos sindicalizados. Na prática desligavam-se sindicato, quando não tomavam posições de secessão de maneira formal para fundar outros sindicatos. Com a introdução do cancelamento da homologação, fica agora claro que somente quem homologa é que pode cancelar essa homologação, o que permitirá que a secretaria regional, onde isto ocorrer, tomar providências para a reorganização da seção sindical. Deste expediente, já estamos fazendo uso em locais onde houve separação abrupta e já estamos reorganizando a seção sindical com a aquiescência do congresso. É claro que nada disso ocorre sem luta política. O que estamos fazendo é nos garantir para o caso de haver disputas jurídicas, ficando, dessa forma, o sindicato coberto pelo estatuto aprovado em congresso.

 

Conlutas - Qual seu posicionamento sobre as deliberações relacionadas ao processo de reorganização da classe da classe trabalhadora e contribuição ativa e decisiva, no âmbito da CONLUTAS, no processo de unificação e construção de uma nova central, classista, sindical e popular?

 

Marina - Inicialmente, quero salientar que o esforço do ANDES-SN no processo de reorganização da classe trabalhadora não é recente. Nosso sindicato está integrado à CONLUTAS e tem lutado para que nesse campo de luta se aglutinem os setores combativos dos trabalhadores brasileiros. Para tanto, estaremos durante o primeiro semestre nos preparando para o Congresso da Classe Trabalhadora que tratará da fundação da nova central. Pretendemos que esta discussão se aprofunde nas bases com debates e encontros nas seções sindicais. Entendemos que a conjuntura e o quadro estrutural da sociedade brasileira exigem uma nova organização que reafirme a autonomia sindical e a independência dos trabalhadores no enfrentamento ao capital.

 

Conlutas - O Plano de Lutas aprovado para o conjunto dos setores do sindicato sinaliza a necessidade da resistência e da organização para a luta, isto em sincronia com os estudantes e outros trabalhadores, em defesa da Universidade Pública e dos direitos sociais. Esse é o melhor caminho para o plano de lutas da Andes-SN?

 

Marina - A concepção que fundamenta o nosso sindicato é a de que somos uma entidade de professores, na defesa dos seus direitos, buscando a construção e consolidação de uma universidade pública e gratuita, autônoma, democrática e de qualidade socialmente referenciada. Mas não vivemos isolados. A universidade não é uma ilha. Estamos inseridos em uma sociedade historicamente construída com mil mazelas e desigualdades, onde se dá a luta de classes. A universidade está implantada neste contexto. É fruto desse contexto. Porém, não está inerte. Pensa o país, o mundo e é feita de gente que vive nesse mundo. Assim, quer para reproduzir, quer para ultrapassar as contingências que se apresentam é preciso estar mergulhado neste mundo e isto se faz com a articulação e integração com outros movimentos sociais. Primeiro com estudantes e técnicos administrativos por causa da proximidade de fins e com todos os trabalhadores porque circunscrevemos o campo dos que fazem da luta efetivamente a construção da história. É importante que não percamos de vista a nossa origem, que nos dá identidade para operar por meio do nosso trabalho. Mas é muito importante também ter claro que este trabalho se perderá se desconhecermos a nossa identidade maior de projeto social articulado com o conjunto da sociedade.

 

Conlutas - Segundo as resoluções do 29º Congresso, as conseqüências nefastas de programas como o REUNI, a UAB, o sistema IFET, a proposta do “Novo” ENEM, assim como de seus congêneres nas esferas estaduais, tendem a precarizar ainda mais as condições de trabalho docente com reflexos na formação dos jovens. De que maneira isto ocorre?

 

Marina - As ações governamentais têm sido apresentadas e executadas de maneira espetacular. Os problemas que essas ações visam resolver vêm sendo apontados pelo sindicato há décadas. No entanto, no lugar de dialogar com os trabalhadores da educação, o governo se pauta pelas estratégias ditadas pelos organismos internacionais como Banco Mundial, BID que se pautam no economicismo e no tecnicismo para resolver problemas complexos e enraizados de uma sociedade com extremas desigualdades. O Reuni pretende a expansão das universidades com o aumento considerável da carga de trabalho do professor. Aparentemente, a relação de um professor para 18 alunos é “razoável” se compararmos com a dos professores das instituições particulares. É que não pensamos no trabalho universitário apenas com a ministração de aulas. Pensamos ser trabalho sério que inclui ensino, pesquisa e extensão. Se não fizermos assim estaremos apenas repetindo o conhecimento que vem de fora. Então, para que ter universidade? A questão é, pois, fundamentalmente estratégica para a construção de uma sociedade independente com capacidade de traçar os seus destinos. Além disso, vem introduzindo uma nova tipologia de cursos, os chamados bacharelados, que irão diplomar por módulos jovens para o mercado de trabalho. Esse tipo de formação precária pela sua natureza não produz expansão do ensino superior e depõe contra a necessidade urgente de formação de quadros com competência para o país. A Universidade Aberta do Brasil é um programa que desenvolve processos de expansão do ensino superior usando principalmente o ensino à distância. Na verdade este tem sido um campo aberto a instituições privadas que vêm massificando este tipo de ensino, com custos elevados para os estudantes e ganhos substanciosos de quem ministra esses cursos. Quanto aos IFETS que vêm substituindo os antigos CEFETS, cuja excelência era altamente reconhecida estarão disponíveis para todas e quaisquer demandas que venham a surgir, não importando o interesse acadêmico, para realizar um “ensino de resultados” que, aliás, é a lógica central do programa educacional do governo.

 

Nós queremos muita expansão, com muitos alunos formados, queremos universidades em todos os rincões do país, mas queremos instituições sustentadas pelo estado, portanto, instituições públicas, que atendam a maioria dos jovens em idade escolar, que realizem pesquisa, produzam conhecimento. Para tanto, entendemos que as universidades devem ser respeitadas na sua autonomia, valorizadas na sua democracia interna. E que os professores tenham uma carreira que lhes permita realizar o seu trabalho em condições dignas, com salários compatíveis com as necessidades da profissão.

 

Conlutas - A aprovação do sistema de cotas como política transitória para a universalização do acesso e permanência à educação superior foi um debate polêmico. Por que o tema provoca tanta polêmica entre os docentes?

 

Marina - Essa questão tem insistentemente sido debatida com o sindicato adotando uma posição a favor das políticas universalistas, tendo com eixo a questão classista que alija consideráveis setores do acesso à universidade, em contraposição às políticas focais. Neste congresso, esse enfoque não foi abandonado. A adoção do sistema de cotas deve ser vista sob o aspecto da transitoriedade para atender as situações agudas de desrespeito aos direitos de importantes setores e que vêm cobrando providências para reparar flagrantes injustiças. No entanto, continuamos a entender como condição necessária para o avanço da sociedade o compromisso com políticas universalistas cuja aplicação se dará pela mobilização dos movimentos sociais que obriguem o estado a se comprometer com políticas públicas no alcance de toda a sociedade.

 

Conlutas - Qual a sua avaliação da atuação do governo Lula diante da Educação Pública?

 

Marina - O governo Lula dá seqüência a uma série de iniciativas de governos anteriores. A visão que tem da educação pública, além de burocrática, segue o receituário dos organismos internacionais cuja lógica é a da globalização, vale dizer com características marcadamente neoliberais. Neste sentido, em nome da priorização do ensino básico, considera que na expansão do ensino superior a iniciativa privada deve ter um papel fundamental. Essa consideração especial com o setor privado reforça a concepção de educação como mercadoria que precisa rapidamente ser massificada dada a grande procura de milhares de jovens que desejam uma formação superior. Daí a invenção do PROUNI que teve papel relevante no momento em que muitas escolas superiores apresentavam grande crise de caixa com a inadimplência de muitos estudantes. Em lugar de fazer aumentar as vagas do ensino superior público, o governo preferiu favorecer consórcios educacionais privados. Quando, porém, indicou a expansão de vagas no ensino superior público, como foi o caso da proposta do REUNI, o fez com prejuízos para o ensino, a pesquisa e a extensão e com o aumento da sobrecarga de trabalho dos professores, além de forçar a introdução de novas modalidades de cursos que não melhorarão a qualidade do ensino superior. Ademais, essa situação é agravada porque o sistema educacional brasileiro vem sendo cada vez mais esgarçado e fragmentado entre os diversos níveis de ensino. Assim, a educação brasileira não é tratada como um todo com seus diversos componentes e fases, do que resulta um processo fatigante, descontínuo que trata os problemas estruturais de forma pontual como se conjunturais fossem. Um bom exemplo é o novo ENEM, feito de maneira espetaculosa em nome da democratização do acesso às universidades públicas. Os problemas foram muitos até agora e a maioria das opiniões tem destacado a inconseqüência dessa providência. Melhor faria o governo se atendesse os pleitos estabelecidos no Plano Nacional de Educação da Sociedade Brasileira, elaborado e consolidado nos Congressos de Educação realizados por diversas entidades, sindicatos e movimentos sociais, repassando os recursos necessários para a execução de um programa de expansão das universidades que respeitasse a sua autonomia, que fortalecesse a pesquisa e pagasse salários condizentes com a profissão, configurando um sistema nacional de educação pública para todos os brasileiros.

 

Conlutas - Como você vê a integração do ANDES-SN na campanha de solidariedade ao povo haitiano, acredita que esta resolução contribui reafirmar o princípio da solidariedade internacional de classe?

 

Marina - Na abertura do Congresso do ANDES-SN a fala do jornalista haitiano Franck Seguy tocou profundamente a todos os presentes. O Haiti é hoje retrato da tragédia que se abate sobre os povos que vêm sendo explorados de forma voraz pela selvageria do imperialismo. Os países que extraem as riquezas dos miseráveis até a raiz são aqueles que mais se oferecem para ajudar. Na verdade, preparam as esferas de influência e a manutenção de controles sobre o país. O ANDES-SN já se manifestou anteriormente, em congresso, contrariamente à presença de tropas brasileiras naquele país. Portanto, a questão do Haiti faz parte da nossa pauta de lutas. Neste momento, a nossa moção pode parecer simples, porém ela se junta às manifestações de milhares de organizações e representações de trabalhadores realmente preocupados com a emancipação de todos os povos do jugo do capital. A nossa compreensão de solidariedade de classe, pois, circunscreve-se a todos os que lutam por um novo mundo liberto da opressão e das desigualdades!