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Em Porto Alegre, haitiana denuncia repressão das tropas da ONU e pede apoio dos brasileiros

A Conlutas trouxe ao Brasil uma delegação haitiana, com o intuito de divulgar à população brasileira o que realmente está ocorrendo naquele país desde o princípio de sua ocupação pelas tropas da ONU, há cinco anos. O que os brasileiros tem a ver com isso? Muito. Tropas brasileiras lideram a missão da ONU, chamada Minustah. Além disso, é dever dos trabalhadores brasileiros prestar solidariedade de classe, visto que os trabalhadores haitianos estão proibidos até de se mobilizar por melhores condições de trabalho, sob pena de serem reprimidos pela Minustah. Na atividade de Porto Alegre, o auditório do Sindppd/RS recebeu a haitiana Carole Pierre Paul-Jacob, dirigente da organização Solidariedade das Mulheres Haitianas.

Ação ilegal e ilegítima - "A Minustah é ilegal e ilegítima", foi com essas fortes palavras que Carole iniciou sua palestra para um auditório lotado e atento à mulher de fala decidida e coração despedaçado por seu país. Ilegal, continuou Carole, porque foi imposta ao povo haitiano. Ilegítima porque foi composta por uma série de mentiras que tinham por objetivo fazer crer que no Haiti havia risco de guerra, tentando justificar uma "missão de paz". "A ONU manda tropas de paz quando há guerra civil, crime contra a humanidade ou genocídio. E nenhum desses casos é o caso do Haiti", esclareceu.

Tropas defendem um projeto neoliberal, não o povo - Carole denunciou que de humanitária a missão da ONU não tem nada: atende a interesses bastante específicos, especialmente o interesse das multinacionais de lucrarem em cima de mão de obra barata, do suor do povo haitiano. "Há, desde os anos 80, um projeto em curso, idealizado ainda pelo governo americano do Ronald Reagan em parceria com a ditadura que havia no Haiti, conhecido por Iniciativa da Bacia Caribenha", contou Carole. Tal projeto tinha por objetivo criar um grande centro de mão de obra barata na bacia caribenha, que inclui o Haiti, atraindo o interesse de diversas multinacionais e impedindo, assim, o desenvolvimento da indústria nacional. O resultado disto é o aumento da dependência do Haiti de produtos de outros países (especialmente dos EUA) e a privatização da maior parte dos serviços públicos (inclusive a saúde e a educação), marginalizando ainda mais o acesso da população mais carente a esses serviços. É esse projeto que as tropas da ONU defendem no país, repremindo sistematicamente qualquer manifestação popular contra essa situação.

Daqui a pouco, nem mais o sol - Com a degradação da produção nacional, só restaram o sol e as praias para a indústria haitiana, dependente do turismo. "Mas a intervenção da ONU está acabando, inclusive, com o turismo no país, amedrontando as pessoas e cessando o que poderia ser fonte de riqueza para o nosso povo", repudia Carole.

População aterrorizada - "Existem diversos dossiês que a ONU não divulga, por razões óbvias, sobre verdadeiras atrocidades cometidas pela Minustah nesses cinco anos", continuou a denunciar Carole. Segundo a haitiana, 108 soldados do Sri Lanka, parte da tropa da ONU, tiveram de ser expulsos do país por terem violentado mulheres e crianças. Em 2004, a população do bairro mais popular da capital foi massacrada em uma ação covarde e criminosa da Minustah. Não houve divulgação do ocorrido. Por conta disto, escolas foram fechadas em bairros mais carentes.

Trabalhadores impedidos de se organizar - No dia do trabalhador deste ano (1º de maio), houve novamente repressão massiva, quando trabalhadores tentaram se manifestar pela implantação do novo salário mínimo (o salário mínimo, no Haiti equivale a cerca de 100 reais por mês, sem reajuste desde 2003). Em represália a estudantes que se manifestaram, a Minustah bombardeou a Universidade local com gás lacrimogêneo, que atingiu um hospital e afetou até os doentes e os poucos médicos.

Minustah: uma mentira cara - "Três bilhões de dólares nesses cinco anos. Foi isso que custou a Minustah. A ONU gasta 60 mil dólares por ano por soldado que mantém no Haiti", apontou Carole, enunciando a contradição: "isso em um país onde o Estado não tem nem 250 dólares por cidadão por ano para investir em serviços sociais. É um escândalo". Além de escandalosamente cara, a Minustah é uma farsa, defende Carole: "O nome Minustah é uma mentira, significa Força de Manutenção da Paz e Segurança no Haiti. Lá em nosso país, nós dizemos que significa Força de Manutenção do Medo e da Insegurança no Haiti".

Solidariedade brasileira e internacional é fundamental - Carole não se despediu sem antes sublinhar a necessidade dos brasileiros exigirem de seu governo a retirada das tropas do Haiti: "por tudo isso, é muito importante que os trabalhadores brasileiros se unam às forças populares haitianas para exigir do governo brasileiro a retirada de suas tropas. A contrapartida de toda a repressão que estamos vivendo lá é a construção de uma resistência contra a Minustah, que em muito depende da solidariedade internacional. Por isso estamos aqui".

Ao final, um causo - Carole contou que Lula, quando foi ao Haiti no princípio da ocupação levou consigo jogadores de futebol. Entre os mais festejados pela população, que adora o futebol brasileiro, estavam Ronaldo, Ronaldinho e Adriano. Não deu outra, a delegação brasileira foi recebida com faixas e gritos de "Viva Ronaldo! Viva Ronaldinho! Viva Adriano! Viva Lula!". Um ano depois, Lula retornou ao Haiti, mas agora a população já sofria com a repressão das tropas lideradas pelos brasileiros. Novamente, faixas e gritos recepcionaram o presidente do Brasil, agora com "Viva Ronaldo! Viva Ronaldinho! Viva Adriano!...Abaixo Lula!".